A INTERNACIONALIZAÇÃO DO CAPITAL NACIONAL
EVASÃO CAMBIAL OU DE DIVISAS PARA PARAÍSOS FISCAIS
São Paulo, 25/02/2008 (Revisada em 21-10-2024)
Sonegação de Tributos - Caixa Dois - Constituição de Bancos Offshore em Paraísos Fiscais - Holding - Empresas Fantasmas nas Ilhas do Inconfessável. Lavagem de Dinheiro - Blindagem Fiscal e Patrimonial - Ocultação de Bens Direitos e Valores - Lei 9.613/1998 - artigos 21 e 22 da Lei 7.492/1986 - Lei do colarinho Branco.
INCENTIVOS À INTERNACIONALIZAÇÃO DO CAPITAL
Por Américo G Parada Fº - Contador - Coordenador do COSIFE
Veja no texto Constituição de Bancos Offshore em Paraísos Fiscais o esquema de como operavam os bancos virtuais e quais as medidas tomadas pelo Banco Central do Brasil a partir de 2005 para impedir suas atuações.
1. Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes
A criação do Mercado de Câmbio de Taxas Flutuantes no final do ano de 1988 indiscutivelmente foi o primeiro passo para abertura de um caminho mais rápido e fácil por onde pudesse ocorrer a Internacionalização do Capital dos empresários ou grandes investidores brasileiros.
Mas, inicialmente a explicação de nossas autoridades monetárias era a de que o tal mercado visava atender aos turistas de nosso país em viagens ao exterior, por isso ficou inicialmente conhecido como o mercado do "DÓLAR TURISMO".
O estranho era que nossas autoridades monetárias sempre levantaram barreiras e restrições à obtenção de moeda estrangeira pelos turistas brasileiros e naquele momento queriam fazer o inverso, reduzindo o ágio entre o dólar no mercado paralelo e o oficial, justamente para beneficiar tais turistas ulteriormente tão perseguidos.
É interessante observar que a redução do ágio na compra e venda de dólares também beneficiaria a lavagem de dinheiro e a internacionalização do capital nacional, ou melhor, beneficiava principalmente os TURISTAS. Assim, a partir daí seria necessária menos moeda nacional para que fossem remetidos mais dólares ao exterior.
Somente 5 anos depois da criação do mercado de taxas flutuantes, em 1993, a diretoria do Banco Central por intermédio de uma cartilha intitulada "O Regime Cambial Brasileiro" explicou a real intenção da criação do tal mercado de câmbio, que era a de regulamentar o câmbio paralelo e evitar os excessivos ágios que acabavam provocando a desvalorização de nossa moeda, empurrando o preço do dólar oficial para cima.
Isto era ruim tanto para quem queria viajar quanto para quem queria remeter dinheiro ao exterior. Ou seja, para ambos os segmentos o "câmbio negro" (assim chamado àquela época) era ruim e nesses segmentos só estavam os endinheirados.
A desvalorização de nossa moeda forçada pelo tal "câmbio negro", ao contrário, era benéfica às exportações, tal como aconteceu em 2004. Mas parece que a intenção era exatamente a de exportar capital e não mercadorias.
As mercadorias eram exportadas por preços baixos (subfaturamento das exportações) para que a diferença em dólares, aqui recebidos a menor, ficassem depositados no exterior. Dessa forma, a supervalorização de nossa moeda beneficiava os mais ricos e prejudicava os mais pobres porque artificialmente reduzia os salários.
Antes da criação desse mercado câmbio flutuante a cotação do dólar no paralelo ou no "câmbio negro" chegou a ter ágio de 130%, o que desencorajava a remessa de dólares ilegalmente ao exterior. Prevalecia a chamada "Lei da Oferta e da Procura". Como a procura era muito grande, e a oferta de dólares era baixa, o preço no mercado paralelo subia assustadoramente.
Houve até um banco francês que, ao remeter dólares para o Brasil para integralização de seu capital, os vendeu no "câmbio negro" pois assim recebia mais do que o dobro de moeda nacional. O governo brasileiro em razão desse ato deveria suspender as atividades do banco aqui, porém "não o fez por problemas diplomáticos". Na verdade o Brasil precisava mais deles do que eles de nós.
O mesmo aconteceu com os dólares da venda de um famoso jogador de futebol carioca a um time europeu. Não de pode citar os nomes justamente porque nada aconteceu com eles. Seria uma leviandade acusá-los e por isso até poderíamos ser condenados a alguns anos de cadeia e ao pagamento de elevada indenização que nos tornaria indiretamente em seus escravos.
Ainda em 1989, por ocasião da campanha presidencial em que os principais concorrentes eram Luis Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello, o então presidente da FIESP - Federação das Indústrias do Estado de São Paulo declarou aos órgãos de imprensa que, se Lula fosse eleito, 800 mil empresários brasileiros iriam para o exterior.
Foi quando pudemos deduzir que o caminho para internacionalização do capital nacional tinha sido aberto com a criação do citado mercado de câmbio flutuante. Com ele o ágio entre o paralelo e o oficial caiu e assim passou a ser mais barato remeter dinheiro ao exterior.
Veja no texto Constituição de Bancos Offshore em Paraísos Fiscais o esquema de como operavam os bancos virtuais e quais as medidas tomadas pelo Banco Central do Brasil a partir de 2005 para impedir suas atuações.
2. As Operações de Arbitragem de Ouro por Dólar
Resta-nos saber onde eram conseguidos os dólares para remessa ao exterior depois da criação do mercado de câmbio flutuante.
Depois da criação do mercado câmbio de taxas flutuantes o Banco Central instituiu as operações de arbitragem de ouro por dólar. Através dessa operação a autarquia comprava ouro extraído de nossos garimpos e efetuava o pagamento em dólares de nossas reservas monetárias, cotado no mercado de taxas flutuantes, que nessa época já não apresentava o exorbitante ágio anteriormente verificado. O ágio naquela ocasião era bem inferior a 5% (talvez de 1% a 2%).
A razão da redução tão sensível do ágio, ou melhor, da desvalorização do dólar no paralelo foi exatamente em razão da "Lei da Oferta e da Procura", citada acima, cujos efeitos poderão ser melhor entendidos com o redigido a seguir.
O ouro ativo financeiro (Lei 7.766/1989) era vendido a nossa autoridade monetária por distribuidoras e corretoras de títulos e valores mobiliários, que o adquiriam de garimpeiros através de seus PCO - Postos de Compra de Ouro, cujas normas estão no MNI 1-4-1 - MANUAL ALTERNATIVO DE NORMAS E INSTRUÇÕES.
As citadas instituições do mercado distribuidor entregavam o ouro, devidamente purificado e em lingotes-padrão para custódia nas Bolsas de Mercadorias e de Futuros. Entretanto o ouro era vendido ao Banco Central no mercado de balcão e não por intermédio do pregão dessas bolsas. Ao receber os certificados de custódia, a autarquia federal efetuava o pagamento dos dólares no dia seguinte, mediante transferência bancária, cujos creditados em moeda estrangeira tanto podiam estar no Brasil como no exterior.
Com a realização dessas operações de arbitragem foram colocadas no mercado de câmbio elevadas quantidades de dólares para serem vendidas aos turistas. Porém, as quantidades eram muitas vezes maiores do que aquelas que poderiam ser absorvidas pelos nossos turistas. Assim a tal "Lei da Oferta e da Procura" tornou-se responsável pela rápida e quase instantânea redução do ágio existente entre o dólar oficial e o paralelo.
Disso resultou prejuízo para o país?
Sim, houve prejuízo, e muito. Se o Banco Central tivesse comprado o ouro mediante o pagamento em moeda nacional, nas reservas monetárias teríamos não apenas o ouro como também os correspondentes dólares. Como os dólares foram entregues aos agentes do mercado financeiro e de capitais, o governo ficou apenas com a metade das reservas que poderia ter ficado. A moeda desviada das reservas monetárias foi toda levada para paraísos fiscais.
Os "economistas de plantão" diziam que a medida era acertada porque se fosse aumentada a quantidade de moeda nacional em circulação haveria inflação. E houve do mesmo jeito, acho que quase todos estão lembrados, pelo menos os mais velhos. A nossa inflação era por outros motivos completamente artificiais e não tinha nada do descrito na teoria econômica. Era uma inflação de expectativa. Os próprios "economistas de plantão" espalhavam suas previsões de inflação futura e os empresários tratavam de aumentar antecipadamente os preços em dobro do previsto como forma de obterem mais numerário nacional para ser trocado por dólares e ser remetido ao exterior.
Foi assim que o excesso de dólares em circulação, não absorvidos pelos turistas, passou a fazer o mesmo caminho do dos turistas, o do exterior, só que não mais nos bolsos dos viajantes, mas através das contas correntes bancárias conhecidas como "CC5" mantidas no Brasil por ditos não residentes, que os dirigentes do Banco Central apelidaram de "instituições financeiras internacionais". Todavia, os dólares foram remetidos não para custeamento de viagens internacionais das classes média e alta, mas, sim, para internacionalização do capital nacional das elites empresariais, aquelas que causaram a citada inflação artificial.
Foi assim que antes mesmo do confisco efetuado pelo governo Collor, em março de 1990, grande parte da moeda estrangeira foi para o exterior, comprada pelos empresários citados pelo tal presidente da FIESP. E Collor fez exatamente aquilo que Lula ia fazer, segundo diziam, mas só conseguiu pegar a poupança do povão. Os ricos já tinham escondido a sua em paraísos fiscais.
Depois os endinheirados tiveram que trazer parte dos dólares de volta para que pudessem suprir suas necessidades megalomaníacas. Foi dessa forma que nova grande oferta de dólares fez com que no início do governo Collor os ricos conseguissem apenas oitenta centavos de nossa moeda por dólar que tinham no exterior ou dentro de seus colchões, tal como faziam alguns de nossos antigos ascendentes.
Veja no texto Constituição de Bancos Offshore em Paraísos Fiscais o esquema de como operavam os bancos virtuais e quais as medidas tomadas pelo Banco Central do Brasil a partir de 2005 para impedir suas atuações.
3. Movimentação das Contas CC5 por Instituições Fantasmas
Tal como foi dito no tópico anterior, a partir da criação do Mercado de Taxas Flutuantes (MTF), como foi originalmente chamado, o dólar também passou a circular pelas contas CC5, sendo que antes circulava em papel moeda, em cheques emitidos contra bancos estabelecidos no exterior ou mediante ordens de pagamento via telex. Por isso, este último tipo de operação era chamada de "dólar cabo" (Cabo de "cable" = telégrafo ou cabograma, nos EUA).
Antes da larga utilização do mercado de câmbio flutuante e das contas "CC5" pelos doleiros, estes utilizavam de contas correntes mantidas em distribuidoras e corretoras de títulos e valores mobiliários, onde utilizavam nomes fictícios. Era a época das chamadas "contas frias" não só nas citadas instituições do mercado distribuidor como também nos bancos e até em fundos de investimentos.
Os doleiros liquidavam suas aplicações todos dias, solicitando que a instituição do mercado distribuidor, da qual muitas vezes era direta ou indiretamente associado, emitisse diversos cheques que eram entregues aos vendedores dos dólares. Mas, na citada instituição constava que o cheque se referia à liquidação de um investimento "ao portador". O referido cheque era emitido sem a identificação do favorecido.
Para cobrir os cheques emitidos no dia, o doleiro depositava outros cheques ou dinheiro recebido pela venda de dólares. Na realidade os títulos que serviam de lastro para tais operações não precisavam existir, pois diariamente eram compradas as mesmas quantidades vendidas sem que o comprador e o vendedor fossem identificados.
Mas, em março de 1990 a Lei 8.021/1990 proibiu a emissão de cheques sem a identificação do favorecido e a realização de operações também sem identificação, assim como as aplicações em fundos de investimentos. Ainda no mesmo ano o artigo 19 da 8.088/1990 proibiu a emissão de títulos "ao portador", fato que havia sido esquecido na lei anterior.
Foi a partir de quando comecei a perceber que os antigos caminhos para remessas ao exterior estavam deixando de ser utilizados, dando lugar às contas correntes bancárias conhecidas como "CC5". Note que principalmente a partir de 1992 deixou-se falar do "dólar cabo", cuja cotação era diariamente anunciada pelos meios de comunicação, indiretamente cúmplices da internacionalização, pois sabiam das manobras mas não as levavam ao conhecimento do público.
As citadas contas CC5, de conformidade com o art. 57 do Decreto 55.762/1965, que regulamentou a Lei 4.131/1962, com as alterações da Lei 4.390/1964, permitiam apenas as remessas para o exterior dos valores oriundos do saldo restante nas mesmas que fossem provenientes de vendas de câmbio. De acordo com a citada norma, as remessas de valores não originários da venda de moedas estrangeiras estavam a sujeitas à comprovação do pagamento de imposto na sua origem e do previsto na Lei 4.131/1962, quando da remessa ao exterior, o que não estava acontecendo.
Instituições financeiras estrangeiras constituídas em paraísos fiscais tinham aberto contas bancárias sem que tivessem o registro no CGC (atual CNPJ) e estavam captando depósitos em suas contas correntes bancárias, transformando a moeda nacional em dólares e remetendo-os para contas no exterior, geralmente nos Estados Unidos da América.
O interessante é que nessas operações das instituições financeiras estrangeiras de paraísos fiscais existiam várias irregularidades. Primeiramente nenhuma pessoa jurídica poderia abrir conta bancária sem que estivesse inscrita no CNPJ (antigo CGC - Cadastro Geral de Contribuintes), de conformidade com o disposto no Regulamento do Imposto de Renda vigente na época, e para isso precisava estar legalmente estabelecida no Brasil. Entretanto, não era isso o que acontecia.
Aquelas instituições financeiras estrangeiras não tinham a autorização para funcionar no Brasil, que seria dada pelo poder executivo, de acordo com o disposto no artigo 18 da Lei 4.595/1964. Assim sendo, estavam captando depósitos à vista sem autorização e operando ilegalmente, o que as sujeitava às sanções previstas nos artigos 17 e 44 da citada lei e da Lei 7.492/1986 (Lei do Colarinho Branco).
Isto foi colocadoi no relatório de fiscalização relativo a um dos casos averiguados, cuja prática era comum às demais instituições. Como os valores remetidos ao exterior não eram oriundos de venda de câmbio, as remessas também estavam sujeitas ao pagamento de imposto.
Em cursos de ministrava na Secretaria da Receita Federal desde 1984, e que se prolongaram até 1998, sobre a fiscalização das operações no SFN - Sistema Financeiro Nacional, foi explicado o que estava ocorrendo em detrimento dos cofres públicos.
Os cursos eram ministrados de conformidade com o disposto no art. 28 da Lei 6.385/1976 que previa o intercâmbio de informações entre o Banco Central do Brasil, a CVM - Comissão de Valores Mobiliários e a SRF - Secretaria da Receita Federal. E assim funcionários dos três órgãos governamentais freqüentavam o curso visto que estavam subordinados ao Ministério da Fazenda e todos estavam sujeitos ao mesmo sigilo fiscal, que é mais absoluto do que o equivalente sigilo bancário obrigatório aos funcionários e dirigentes das instituições do SFN.
Vendo que não estava acontecendo em sua plenitude o intercâmbio de informações previsto no art. 28 da Lei 6.385/1976 sob a alegação de sigilo bancário por parte do Banco Central e de sigilo fiscal por parte da SRF (RECEITA FEDERAL), a COSIT - Coordenação do Sistema de Tributação do MF - Ministério da Fazenda tomou a iniciativa de promover na ESAF - Escola de Administração Fazendária um seminário para que fosse firmado um convênio entre os três órgãos governamentais, que se realizou em 1992.
Foi quando aos três grandes grupos de representantes governamentais foi exposto o que vinha acontecendo relativamente à evasão de divisas através das instituições financeiras fantasmas constituídas em paraísos fiscais.
Diz-se FANTASMA porque ninguém sabia onde exatamente estava a sede das mesmas, visto que em seus países de origem esta sede geralmente é uma caixa postal e no Brasil também ninguém sabia onde estavam estabelecidas, embora movimentassem altos valores com assiduidade em suas contas bancárias todos os dias.
Enquanto todo correntista de banco tem que apresentar um, digamos, "atestado de residência", as instituições financeiras ditas internacionais estavam liberadas de apresentar endereço, mesmo que este fosse falso. E ao contrário do que era e ainda é exigido das pessoas físicas e jurídicas, daquelas instituições FANTASMA nunca era exigido a comprovação de que estavam estabelecidas no Brasil com autorização governamental.
O interessante da questão foi que os dirigentes do Banco Central não queriam que seus servidores fossem explicar como funcionava o esquema de remessas ilícitas ao exterior sob a alegação de que estava infringindo o sigilo bancário.
Sabendo disso a COSIT (coordenação do sistema de tributação) por ofício ao presidente da nossa autarquia federal solicitou a presença do atual coordenador do COSIFE no referido seminário para ministrar palestra em nome da Secretaria da Receita Federal. Não satisfeitos, os dirigentes do BACEN tentaram persuadir o servidor do BACEN a não aceitar o convite.
Como os dirigentes do BACEN não puderam negar ao pedido efetuado por ofício, tendo em vista o art. 28 da Lei 6.385/1976, O servidor do BACEN apareceu em Brasília para realizar a palestra como representante da Receita Federal sob os olhares de alguns chefes de departamento do BACEN, que acintosamente depois da explanação retiram-se do evento. O pior foi que a bronca sobrou para chefe da divisão em trabalhava o servidor do BACEN, que, por ordem superior, não conseguiu evitar a presença do palestrante em Brasília.
Como no seminário foi dito que "instituições financeiras internacionais" (assim denominadas pelos dirigentes do Banco Central) não podiam ser mantenedoras daquele tipo de conta bancária privativa de pessoas físicas e jurídicas que vinham realizar trabalhos esporádicos no Brasil, dias depois os chefes dos Departamentos de Câmbio e de Normas expediram a Carta-Circular BCB 2.259/1992 dando autorização para que aquelas instituições fantasmas pudessem manter tais contas bancárias de não residentes, embora as demais instituições bancárias brasileiras não as pudessem ter.
Note que a norma foi assinada por dois chefes de departamento, quando a original Carta-Circular BCB 5/1969 (CC5) tinha sido firmada pela diretoria da autarquia federal, dada a sua importância e porque seu conteúdo estava previsto no art. 57 do Decreto 55.762/1965 assinado pelo presidente da república em pleno regime militar. Aliás, um ato discricionário que não estava daquela forma previsto na lei. O mesmo aconteceu com o texto da Carta-Circular BCB 2.259/1992 que naquela época também não estava e ainda não está previsto na legislação em vigor. A partir daí a coisa se desenrolou de tal forma que alguns jornais foram obrigados a publicar.
Outra coisa interessante foi ver que algum tempo depois um dos signatários da Carta-Circular BCB 2.259/1992 assumiu o cargo de Diretor de Normas do Banco Central no governo FHC e lá estava durante o governo Lula.
O outro dirigentes do BACEN aposentou e assumiu a diretoria de um banco que foi acusado pela Revista Veja, em sua edição de 23/08/93 - pág. 91, de realizar grande número de operações cambiais irregulares, cujos processos administrativos foram arquivados na esfera administrativa, mas que eram investigados pela polícia federal.
O mesmo fato foi noticiado pelo Jornal do Brasil de 19/08/93 e de 20/08/93, cujas cópias foram distribuídas pelo SINAL - Sindicado dos Funcionários do Banco Central no boletim 34 de 25/08/93.
Mais de um ano depois o jornal Correio Brasiliense de 28/12/94, em sua página 14, transcreveu parte do contido em um documento oficial da CEI - Comissão Especial de Investigação das atividades do Banco Central em que se lia: "A tolerância com a evasão de divisas, por parte do BC (BC é o Banco Central), indica que essa autarquia pode estar negligenciando essa parte de suas responsabilidades fundamentais, sob a influência do Sistema Financeiro, em detrimento dos interesses da Nação".
Veja no texto Constituição de Bancos Offshore em Paraísos Fiscais o esquema de como operavam os bancos virtuais e quais as medidas tomadas pelo Banco Central do Brasil a partir de 2005 para impedir suas atuações.
4. Depósitos de Moeda Brasileira no Exterior
Voltado ao ano de 1992, em que foi expedida a citada Carta-Circular 2.259, que permitiu irregularmente a movimentação de contas bancárias no Brasil por instituições financeiras ditas internacionais, o Banco Central regulamentou os depósitos de moeda brasileira no exterior. Um absurdo, se considerarmos que nossa moeda era inconversível no exterior e tinha um histórico de altamente inflacionária. Era de se acreditar que ninguém depositaria nossa moeda no exterior, a não ser que fosse com a intenção de burlar o depósito compulsório. E foi exatamente isso que aconteceu, conforme será explicado a seguir.
A regulamentação aconteceu com a edição da Circular BCB 2.242, que expediu normas complementares ao disposto na Resolução CMN 1946, tornando regulares as Transferências Internacionais de Moeda Nacional. Os normativos estabeleceram a possibilidade de serem efetuados depósitos em moeda nacional no exterior e a possibilidade de conversão de nossa moeda também no exterior e assim davam aparente “legalidade” ao numerário em moeda nacional obtido irregularmente pelas instituições financeiras “não residentes”.
A Circular BCB 2.242 citava que se considerava como saída do dinheiro do Brasil o simples depósito de recursos na conta de instituições financeiras internacionais (“não residentes”). Com esse ato, ficou subentendido que o Banco Central do Brasil havia autorizado a captação de recursos por essas instituições sem a necessidade da autorização do Poder Executivo, prevista no art. 18 da Lei 4595/1964. Isto é, com tal ato os dirigentes do Banco Central sobrepujaram-se ao Presidente da República.
Note que a Circular não podia autorizar que as instituições financeiras internacionais recebem depósitos à vista. O normal seria que somente os bancos autorizados funcionar no Brasil pudessem captar esse tipo de depósito.
O menosprezo à hierarquia e à legislação também se depreende quando da leitura da cartilha “O Sistema Cambial Brasileiro” (editada em novembro de 1993), onde se lê:
"Se o não residente é uma instituição financeira, o saldo" ... em moeda nacional ..." de sua conta corrente pode ser utilizado para comprar moeda estrangeira e remetê-la ao exterior, sem qualquer restrição".
E, no parágrafo seguinte, os dirigentes do Banco Central explicam:
"Isto significa que se um AGENTE quiser fazer uma remessa para o exterior, basta que deposite" ...moeda nacional... "na conta de uma instituição financeira não-residente e deixe que ela faça o resto".
Porém, nenhum normativo diz isso com tal clareza. E assim, as instituições do SFN passaram a interpretar aquilo como norma e passaram a efetuar a lavagem de dinheiro sem qualquer restrição por parte da autoridade monetária brasileira.
Tal ato irresponsável permite o enquadramento dos dirigentes do Banco Central por crime de peculato e prevaricação.
Foi mediante essa regulamentação que, desde 1992 até a implantação do real como nossa moeda em 1994, muitas empresas faziam depósitos à vista em moeda nacional no exterior em instituições financeiras especialmente constituídas em paraísos fiscais. Estas, ao receber o depósito, imediatamente transformavam a moeda brasileira altamente inflacionária em dólares e os emprestava para outra empresa indiretamente ligada à depositante.
Nessa operação havia uma perda cambial para a empresa depositante, visto que, com uma inflação anual que chegou a casa dos 2000%, um ano depois de efetuado o depósito a nossa moeda valia apenas 5% de seu valor original. Enquanto isso acontecia, a tomadora do empréstimo em moeda estrangeira, além da mesma perda cambial pela desvalorização da nossa moeda ainda tinha que pagar juros pelo empréstimo.
Isto gerava de forma aparentemente legal um "Caixa 2" no exterior equivalente ao total da nossa moeda depositada no paraíso fiscal, em dólares. A operação só não podia ser considerada legal porque se tratava de uma simulação, condenada pelo Código Civil Brasileiro, com intuito de evasão de divisas, também condenada pela Lei 7.492/1986 (Lei do Colarinho Branco).
A operação também podia ser tida como distribuição disfarçada de lucros para pessoas ligadas, de conformidade com Regulamento do Imposto de Renda e com a Lei 4.131/1962 (Lei do Capital Estrangeiro). Veja um exemplo gráfico de Depósitos à Vista no Exterior.
Esse tipo de operação, que nunca foi combatido, nos dá uma idéia da incompetência ou da conivência de nossas autoridades monetárias da época com o chamado "Planejamento Tributário". Isto ainda continua sendo possível de efetuar, mas em menor escala, tendo em vista os índices inflacionários atuais são inferiores.
Veja no texto Constituição de Bancos Offshore em Paraísos Fiscais o esquema de como operavam os bancos virtuais e quais as medidas tomadas pelo Banco Central do Brasil a partir de 2005 para impedir suas atuações.
5. As Operações no Sistema Financeiro Não Oficial
"O SISTEMA FINANCEIRO NÃO OFICIAL" foi o título dado pela procuradora da república Sandra Cureau ao seu artigo publicado pela Revista da Procuradoria Geral da República - 6 - páginas 187 a 209, onde relatava várias operações tornadas públicas sobre a atuação das tais instituições financeiras internacionais com a anuência dos dirigentes do Banco Central do Brasil.
Não se sabe exatamente quando foi publicado o artigo, mas chegou ao COSIFE cópia da edição no ano de 1995, logo depois que foi instaurado o processo administrativo contra o coordenador deste COSIFE pelo Banco Central sob a acusação de quebra de sigilo, por estar explicando a auditores fiscais da Receita Federal como combater a lavagem de dinheiro.
Essas explicações foram solicitadas pela Receita Federal (Ministério da Fazenda) mediante ofício ao BACEN com base nas disposições do artigo 28 da Lei 6.385/1976.
Não satisfeitos por não terem conseguido imputar a pena administrativa, o coordenador deste COSIFE foi denunciado ao Ministério Público Federal por quebra de sigilo, segundo o artigo 38 da Lei 4.595/1964 e com base na Lei do Colarinho Branco (Lei 7.492/1989).
Em 2003, por outro motivo, o coordenador deste COSIFE prestou depoimento à procuradora Raquel Branquinho do Ministério Público Federal, ao qual foi anexada cópia da monografia intitulada "Quem Abriu as Portas à Lavagem de Dinheiro", onde está relatado o trabalho realizado desde 1980 até 1995 como forma de desvendar as formas utilizadas para lavagem de dinheiro e para internacionalização do capital nacional, período em que houve a conseqüente contribuição para aperfeiçoamento da legislação brasileira.
Fato interessante é que as "instituições financeiras internacionais" constituídas em paraísos fiscais que operavam nesse chamado de "sistema financeiro não oficial", eram e ainda são concorrentes dos próprios bancos onde estavam e estão as suas respectivas contas correntes, donde podemos presumir que havia e há conivência dos bancos que acolhiam e acolhem tais contas.
Isto significa dizer que as instituições usuárias da CC5 recebiam depósitos à vista, efetuavam a compra e venda de moedas estrangeiras, tomavam dinheiro emprestado e emprestavam dinheiro para entidades constituídas e estabelecidas no Brasil, tal como faz qualquer outro banco devidamente habilitado.
O detalhe impressionante é que faziam tudo isso dentro do estabelecimento de um outro banco que acolhia sua conta corrente. E faziam tudo isso sem a necessidade do recolhimento do depósito compulsório e do pagamento de impostos e sem receber a visita da fiscalização fazendária e do Banco Central.
Ou seja, com esse "sistema financeiro não oficial" o Brasil, por deliberação dos dirigentes do Banco Central havia se tornado também um paraíso fiscal, onde o dinheiro realmente circulava, ao contrário do que acontecia com os outros, onde o dinheiro efetiva não circula.
Veja no texto Constituição de Bancos Offshore em Paraísos Fiscais o esquema de como operavam os bancos virtuais e quais as medidas tomadas pelo Banco Central do Brasil a partir de 2005 para impedir suas atuações.
6. Incentivos aos Investimentos Estrangeiros
Em 31/05/1991, por intermédio da Resolução CMN 1832/91 foi acrescentado à Resolução CMN 1289/87 o ANEXO IV, que ficou famoso por permitir a entrada de capital dito estrangeiro para ser investido nas Bolsas de Valores e em Fundos ou Carteiras de Investimentos no Brasil.
O governo logo providenciou uma série de medidas fiscais que praticamente incentivaram a remessa de dinheiro para o exterior, o qual imediatamente era trazido de volta internacionalizado para aplicação no mercado de capitais através do ANEXO IV. Era o chamado “dinheiro volátil”, para investimento de curto prazo e meramente especulativo.
Com a isenção de pagamento do imposto de renda sobre remessas de lucros, juros e dividendos estabelecida a partir de 1996, o dinheiro internacionalizado passou a entrar no Brasil também sob a forma de empréstimos, arrendamento mercantil, compra de participações societárias para internacionalização de empresas que antes eram nacionais, incluindo as estatais que foram privatizadas.
7. A Manutenção da Paridade do Real com o Dólar
Entre todas medidas que facilitaram a internacional do capital nacional está indiscutivelmente a manutenção artificial da cotação de nossa moeda, o Real, com valor aproximado ao do dólar. Foi prejudicial porque, quanto mais baixa era a cotação da moeda americana, mais dólares eram remetidos ao exterior. Esse tipo de medida funcionava como um incentivo à internacionalização do capital nacional, além de prejudicar as exportações e, por conseqüência, prejudicar também os níveis de emprego e de salário médio interno, além de provocar a miséria e o aumento da criminalidade. E isto foi o que exatamente aconteceu durante o governo FHC, porque foi nesse período que mais se manteve artificialmente baixa a cotação do dólar. Tal fato justificou a acusação do Secretário do Tesouro Norte-Americano Paul O'Neil quando declarou que todo dinheiro emprestado ao Brasil, Argentina e Uruguai ia automaticamente para Suíça. Veja Os Erros na Economia Argentina.
De fato a nossa dívida externa aumentou sem que nada de visível fosse feito no Brasil justamente porque todos o empréstimos obtidos eram entregues aos empresários, especuladores, corruptos e lavadores de dinheiro, que estavam internacionalizando o nosso capital.