Ano XXVI - 24 de novembro de 2024

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PEC 241: AUSTERIDADE SELETIVA OU RENT-SEEKING?



PEC 241: austeridade seletiva ou rent-seeking?

EXCLUINDO O POVO DO ORÇAMENTO PÚBLICO II

São Paulo, 17/10/2016 (Revisada em 16-03-2024)

Referências: Temmer e a PEC 241, Tirando dos Pobres para Entregar aos Ricos, Restrições para Elaboração do Orçamento Nacional, Contabilidade Pública ou Governamental e o Perfeito Controle do Fluxo de Caixa, o Direito Financeiro e os Membros do COPOM - Comitê de Política Monetária Impedindo o Pleno Controle da Política Fiscal, Desfalques no Tesouro Nacional.

Por Ricardo Lodi Ribeiro (RJ) - Mestre em Direito Tributário pela UCAM. Doutor em Direito e Economia pela UGF. Professor Adjunto de Direito Financeiro da UERJ. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito. Presidente da Sociedade Brasileira de Direito Tributário (SBDT). Publicado em Direito do Estado - ANO 2016 NUM 277 - 14/10/2016. Com subtítulos e anotações em azul e ainda comentários em NOTAS DO COSIFE por Américo G Parada Fº - Contador - Coordenador do COSIFE.

"As políticas macroeconômicas - incluindo as políticas monetárias - têm em grande medida limitadas pela ideologia, e é a ideologia fundamentalista dos mercados que serve os interesses do topo, muito à custa do resto da sociedade."

(Joseph Stiglitz, O Preço da Desigualdade)

TIRANDO DOS POBRES PARA ENTREGAR AOS RICOS

Como medida destinada a combater o atual déficit fiscal, o Governo Michel Temer mobiliza a sua maioria no Congresso Nacional pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 241/2016 (PEC 241), que propõe o congelamento das despesas primárias [ou despesas com as necessidades básicas da população previstas no Orçamento] da União por 20 anos.

De acordo com a proposta, as despesas realizadas em 2016, atualizadas monetariamente pelo IPCA, constituirão teto para as despesas em 2017. E assim sucessivamente pelos próximos 20 anos.

Ao limitar a proposta apenas às despesas primárias, deixando de fora o pagamento da dívida pública, o Governo Temer reserva para os credores do Estado todo o crescimento econômico que o Brasil vier a conhecer nos próximos 20 anos, constitucionalizando, a partir da proposta de um governo não eleito e por meio da legislatura mais comprometida com os interesses dos seus financiadores - fenômeno que não deve se repetir na mesma proporção nas próximas composições do Parlamento, a se confirmar a esperada redução do financiamento empresarial -, uma decisão que deve ficar a cargo do legislador orçamentário a partir das prioridades definidas pela sociedade, ano a ano.

Ou seja, se a PEC for aprovada, o Governo não eleito pelo povo e o Congresso que o colocou no poder, estabeleceriam as prioridades para todos os próximos governos escolhidos pelos eleitores: apesar do aumento da população, das demandas sociais, do incremento das necessidades de atendimento das políticas públicas, não será possível elevar despesas acima da inflação.

Todo o crescimento real da arrecadação verificado será canalizado para uma única finalidade: o pagamento de dívida pública [artificialmente gerada pela fixação de altas taxas de juros pelos membros do COPOM - Comitê de Política Monetária]. Se já não bastassem consumir atualmente cerca de 40% do orçamento federal, os rentistas serão brindados por todo o crescimento da arrecadação pelos próximos 20 anos.

RASGANDO A NOSSA CARTA MAGNA

É evidente que tal iniciativa causa prejuízos gravíssimos às opções fundamentais estabelecidas pela Constituição Federal de 1988, decretando a morte do Estado Social em nosso país, e o abandono dos objetivos fundamentais da República de constituir uma sociedade livre, justa e solidária, de erradicação da pobreza e da marginalização, de redução das desigualdades sociais e regionais e da promoção do bem de todos (art. 3º, I, III e IV, CF), a partir da impossibilidade de dar atendimento, nos já insuficientes patamares atuais, às despesas de saúde e educação, eleitas pelo constituinte originário como direito de todos e dever do Estado (art. 196, e 205, CF), e por isso merecedoras de percentual mínimo no orçamento definido na Constituição (art. 198, §1º e 212, CF), que estão sendo flexibilizados pela PEC, bem como de previdência e de assistência social, a que a todos a Constituição dirigiu de forma irredutível (art. 194, parágrafo único, II e IV, CF).

NOTA DO COSIFE:

Na Constituição Federal de 1988 lê-se:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III - participação da comunidade.

§ 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. (Parágrafo único renumerado para § 1º pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000)

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

O quadro é bem mais grave do que as palavras e os editoriais podem revelar.

OS DANOS QUE A PEC 241 JÁ TERIA CAUSADO AOS MENOS AQUINHOADOS

De acordo com os dados divulgados em estudo de Flavio Tonelli Vaz [descrito em Le Monde Diplomatique - Brasil), se a proposta estivesse em vigor desde 2005, hoje as receitas de educação seriam um quarto do orçamento efetivamente realizado no ano [de 2015]. Na seguridade social, o mesmo raciocínio levaria a uma redução de 40%.

Como se vê, aprovada a proposta [absolutista de Michel Temmer], teremos uma drástica redução das prestações de saúde e educação no Brasil. Se hoje já estamos muito longe dos objetivos constitucionais, o retrocesso das referidas prestações sociais será incomensurável, comprometendo a vida, o desenvolvimento e a felicidade de toda uma geração.

É como jogar fora o nosso futuro!

OS RICOS TÊM INCONTESTÁVEIS RAZÕES PARA APOIAREM A APROVAÇÃO DA PEC 241

É claro que, como adverte o vencedor do Prêmio Nobel de Economia de 2015, Angus Deaton, na obra The Great Escape: Health, Wealth, and the Origins of Inequality, os ricos têm muitas razões para apoiar tais cortes pois não necessitam de educação ou de assistência de saúde prestadas pelo Estado, mas a democracia resta comprometida com a perda de bem-estar pela população mais pobre, que deixa de identificar razão para participar da vida política do país.

A justificativa apresentada pelo Governo Michel Temmer, erigido pelo Congresso Nacional para tais medidas de austeridade, é a salvação das finanças públicas no Brasil, proporcionando um ambiente de maior confiabilidade para os investidores [os maiores detentores do Poderio Econômico e maiores sonegadores de tributos], a fim de promover o crescimento econômico e o emprego. Segundo o lema governamental, é preciso sair do vermelho!

NOTA DO COSIFE:

No passado, diziam os nossos grandes economistas ortodoxos (monetaristas):

É preciso fazer o bolo crescer para depois distribuir uma pequena fatia ao Povo.

Estamos voltando ao nosso triste passado que resultou nas décadas perdidas de 1980 e 1990 em que quase nada foi feito para o desenvolvimento do Brasil e nem para melhoria do IDH - Índice de Desenvolvimento Humano do povo brasileiro.

ENGESSANDO OS GOVERNANTES FUTUROS

Porém, como adverte o ex-ministro da Fazenda no Governo Sarney, e da Administração e Reforma do Estado no Governo Fernando Henrique Cardoso, Luiz Carlos Bresser Pereira, não há uma crise fiscal estrutural que autorize medidas que comprometem as opções do Estado brasileiro por tanto tempo. Afinal, a proposta de emenda constitucional de Michael Temmer, longe de procurar sanar dificuldades conjunturais, sempre a cargo do legislador orçamentário, amarra as decisões de legisladores e governantes futuros.

Assim, Temmer não condiciona o teto de gastos primário ao desempenho da arrecadação ou da economia brasileira, em um contexto normativo em que, é claro, tais medidas não impedem, pelo menos diretamente, que a economia brasileira se recupere e volte a crescer.

O que a proposta de Temmer faz é, a partir do pretexto da austeridade oferecido pela crise fiscal, promover uma aceleração do processo de transferência de renda do conjunto da sociedade brasileira para o setor financeiro, que passaria a ser o destinatário quase que exclusivo de todas as receitas decorrentes do aumento de arrecadação, seja ele decorrente da elevação da carga tributária ou da melhoria das condições macroeconômicas nacionais.

NOTA DO COSIFE:

Isto significa dizer que os 99% entes da população menos aquinhoada serão obrigados trabalhar mais para que o 1% mais ricos fique muito mais rico nos próximos 20 anos.

Essa é a tal premissa do bolo crescendo para que uma pequena fatia seja devolvida ao Povo na forma de esmola.

Trata-se da implantação de um regime feudal em que impera a escravidão do Povo, que será transformado em vassalo.

A CULPA É DOS MEMBROS DO COPOM - COMITÊ DE POLÍTICA MONETÁRIA

É bem verdade que essa transferência de renda da sociedade para o setor financeiro está há muito em andamento a partir da adoção da política de juros altíssimos, que não possui paralelo no mundo civilizado e nem se justifica pela inexistência de demanda aquecida, e é aliada à adoção de uma carga tributária que beneficia rentistas e proprietários em detrimento de consumidores e trabalhadores, o que também não encontra similar nos países do G-20, e à uma política de incentivos fiscais e financeiros a setores econômicos que não apresentam qualquer contrapartida especial para a sociedade.

A AUSTERIDADE É SELETIVA - PROMOVE O AUMENTO DA DESIGUALDADE SOCIAL

Nesse contexto, a austeridade proposta é seletiva uma vez que, além de não oferecer qualquer revisão para os maiores ralos do dinheiro público no Brasil, ainda reserva todos os excepcionais benefícios do crescimento econômico ao setor financeiro, já que, se aprovada a emenda, todo ele terá como destinatário esse segmento, o que, historicamente, já se comprovou ser medida que não só promove grave elevação da desigualdade social, como compromete o desempenho da atividade industrial a partir do processo de financeirização da economia, conforme advertiu Stewart Lansley na obra The Cost of Inequality - Why Economic Equality is Essential for Recovery, ao analisar o fenômeno no Reino Unido, a partir da década de 1980.

REFORMA TRABALHISTA - CAMINHANDO PARA O TRABALHO ESCRAVO

Não é difícil perceber que a austeridade seletiva da PEC 241 não tem como objetivo o combate à crise fiscal conjuntural, mas a consagração de um projeto de transferência de renda para o topo, que não se esgota com a aprovação da PEC 241, passando também pelas reformas da previdência e trabalhista que pretendem promover medidas que acabarão por retirar riqueza das camadas mais desfavorecidas da nossa população.

PRIVATIZAÇÃO DOS LUCROS E SOCIALIZAÇÃO DOS PREJUÍZOS

Na verdade, os nossos problemas de desigualdade decorrem menos das forças de mercado do que das políticas públicas que se colocam por trás delas. Como afirma Simon Reid-Henry no livro The Political Origins of Inequality: why a more equal world is better for us, se isso é motivo de desespero é também de esperança: os nossos impasses atuais são mais sensíveis a mudanças do que somos encorajados a acreditar. A desigualdade é produto de normas arraigadas de um estatuto jurídico que desqualificam as reivindicações de alguns em detrimento de outros. A aprovação dessas normas na sociedade moderna é a história da luta entre as forças que buscam privatizar ganhos públicos e as que procuram consolidar uma sociedade forte.

ÁS CONVICÇÕES IDEOLÓGICAS DAS ELITES QUEREM O POVO COMO MEROS ESCRAVOS

Como destaca Larry M. Bartels, na obra The New Gilded Age, se é evidente que a desigualdade econômica tem ramificações profundas para a política democrática, a política pode reforçar significativamente ou mitigar as pressões advindas de fatores como a mudança tecnológica, a globalização e as mudanças demográficas. Para o referido autor, a política partidária e as convicções ideológicas das elites políticas têm tido um impacto substancial sobre a situação econômica da classe média e dos pobres, sendo a desigualdade um fenômeno substancialmente político e ideológico.

Quando se fala em pressões dos mercados, é preciso lembrar que, como afirma Robert Reich, em Saving Capitalism - For The Many, Not The Few, os mercados são compostos por seres humanos, assim como as nações, os governos, as leis, as corporações são produtos dos seres humanos.

A LAVAGEM CEREBRAL TRANSFORMA AS PESSOAS EM OBEDIENTES SERVIÇAIS

E, a par do modelo atual, há muitas maneiras alternativas em que podem ser os mercados organizados. No entanto, uma vez organizado, as suas regras criam incentivos para as pessoas, motivando-as a trabalhar e a colaborar, e a serem produtivos e criativos. Ajudam as pessoas a obter a vida que eles procuram. As regras do mercado refletem os valores morais e julgamentos das pessoas sobre o que é bom e digno e o que é justo. Porém, tais regras não são inelásticas, mudando ao longo do tempo, sempre desprezando os mais pobres que, por isso, não conseguem sair da constante miserabilidade.

DESEMPREGO ESTRUTURAL E CONJUNTURAL

Na verdade, a crescente desigualdade de riqueza e renda, não é decorrente apenas da globalização e avanço tecnológico. É muito mais fruto de mudanças que recompensam os mais bem-educados e articulados, punindo àqueles que não detém essas vantagens. Também é decorrente do lobby bem-sucedido pelas elites corporativas para a obtenção de impostos mais baixos, lacunas mais amplas, e os subsídios governamentais mais generosos.

NOTA DO COSIFE:

Os incentivos fiscais, criados pelos primeiros Governos Militares iniciados em 1964, foram concedidos aos mais ricos entes oligárquicos das regiões beneficiadas. Mas, o Povo não saiu de sua antiga pobreza.

Só tiveram benefícios os mais próximos da oligarquia regional. Trabalhadores especializados foram buscados no sudeste brasileiro.

A DESIGUALDADE SEMPRE AUMENTARÁ ENQUANTO EXISTIREM OS PARAÍSOS FISCAIS

A partir do exame da evolução da renda e do patrimônio em duas dezenas de países desenvolvidos e emergentes nos últimos dois séculos, Thomas Piketty, na festejada obra O Capital no Século XXI, constata que a desigualdade entre ricos e pobres tende sempre a aumentar na medida em que a taxa de rendimento do capital (r) torna-se maior do que a taxa de crescimento da renda e da produção nacionais (g). Sempre que r > g a desigualdade aumenta, pois, os patrimônios originados no passado se recapitalizam mais rapidamente do que a progressão da produção e dos salários.

Partindo dessa premissa, Shi-Ling Hsu , em The Rise and Rise of the One Percent: Considering Legal Causes of ealth Inequality, esclarece que há mecanismos nas regras jurídicas e instituições legais que fazem com que a taxa do retorno do capital (r na equação de Thomas Piketty) cresça mais do que o crescimento da economia (g), ou ainda que a primeira cresça mesmo que a último não avance.

Ou seja, a lei tem sido muito mais eficaz em promover o aumento de r do que de g. Isso se dá porque os legisladores encontram grande facilidade em inflar r por meios de subsídios, tratamentos fiscais mais favoráveis e proteções legais contra a interferência regulatória, impulsionando o retorno a certos proprietários de capitais privados que mantém o poder suficiente para ter esse tipo de acesso ao Poder Legislativo.

NOTA DO COSIFE:

O escrito significa que os detentores do poderio econômico têm seu capital devidamente abastecido pelas altas taxas de juros fixadas pelos membros do COPOM e por contratos forjados em licitações públicas, cujos ganhos artificialmente inflados lhes permitem dispor de importantes lobistas (como agentes de pressão), os quais são incumbidos dos contatos necessários à manutenção do privilegiado status quo, sempre em detrimento da maioria menos favorecida.

O BOLO PRECISA CRESCER PARA QUE O POVO TENHA UMA PEQUENA FATIA

Ademais, a influência da teoria do trickle-down - que sustenta estar o crescimento da economia intimamente ligado à riqueza dos mais ricos que [nunca traz visíveis benefícios aos mais pobres além da simplória sobrevivência, porém, em tese, diz-se que], quanto mais os ricos possuem, mais investem [não, em sistemas produtivos geradores de empregos, mas, sim, em mordomias e bens supérfluos], provocando redução de preços [com base na automação da produção geradora de desemprego] e maior consumo [pelos ainda empregados] -, [tal balela] influencia sobremaneira os [tendenciosos] legisladores [amigos de importantes lobistas], dentro da perspectiva de que a adoção de medidas favoráveis aos mais ricos beneficiam a todos. Assim, [com grande propaganda enganadora da opinião pública, intermediada pelos mercenários da mídia] a sociedade e os legisladores são fortemente inclinados a acreditar que o aumento dos retornos privados [mediante benesses governamentais] para o [grande] capital [especulativo] equivale a estimular o crescimento econômico em geral.

MAIS UMA VEZ TIRANDO DOS POBRES PARA ENTREGAR AOS RICOS

O direito, portanto, atua como uma força de divergência em duas fases: em primeiro lugar, contribuindo diretamente para a formação de capital privado, predominantemente em benefício dos mais ricos e, segundo, protegendo o capital de regulamentação ou da concorrência que poderia prejudicar a acumulação de capital.

Promover a formação de valorização do capital privado não contribui para a desigualdade de riqueza se ele também alavanca o crescimento econômico. Feito corretamente, o capital privado deve sustentar o crescimento econômico.

No entanto, as normas jurídicas e instituições que afetam a formação do capital, apesar da fundamentação de suas medidas sempre levar em conta o crescimento econômico e a criação de empregos, não têm sempre se preocupado com o tema na implementação de suas propostas.

Ao contrário, muitas vezes, elas contribuem para a redução da atividade econômica, como na imposição das medidas de austeridade seletiva. Porém, por uma questão de opções políticas, as preferências legais do capital são sempre mais fáceis de obter, como destaca Shi-Ling Hsu.

NOTA DO COSIFE:

Portanto, como sempre acontece, os detentores do grande capital são os mais privilegiados. Por isso, a desigualdade social no mundo tende a aumentar, como de fato vem aumentando.

No Brasil, pelo menos desde 1964, a desigualdade tem aumentado, agravando-se na década de 1990 e prometendo agravar-se ainda mais com a proposta do Presidente Michel Temmer que se baseia no lema escravocrata (feudalista) de tirar dos pobres para entregar aos ricos.

O ESTELIONATO PRATICADO PELOS MAIS RICOS SONEGADORES DE TRIBUTOS

Para o vencedor do Prémio Nobel de Economia de 2001, Joseph Stiglitz, na obra O Preço da Desigualdade, o nosso sistema político funciona de forma a cada vez mais aumentar a desigualdade de resultados e reduzir a igualdade de oportunidades, conferindo excessivo poder aos que estão no topo às expensas do restante da sociedade, não só limitando a redistribuição, mas moldando as regras do jogo a seu favor, com a adoção de atividades de rent-seeking, assim entendidas como "a obtenção de rendimentos não como recompensa por ter criado riqueza mas por açambarcamento de uma fatia excessiva de riqueza que não se produziu".

E explica o laureado economista norte-americano o contexto em que são desenvolvidas as atividades de rent-seeking:

"Os ricos do topo aprenderam a extrair dinheiro dos outros com métodos que esses outros mal conhecem - é essa a sua verdadeira inovação".

As políticas de rent-seeking não só dirigem parcela significativa da renda para o topo, como acabam por destruir montantes expressivos dela, que são subtraídas de toda a sociedade por meio do processo de captação da riqueza pelos mais ricos, uma vez que, como explica Stiglitz no processo de tomar riqueza, há uma parte dela que é destruída.

NOTA DO COSIFE:

Os Estados Unidos, por exemplo, gastaram alguns trilhões de dólares com as guerras imperialistas (que resultaram em riquezas destruídas). Porém, o retorno financeiro mediante a importação de commodities (mercadorias) não foi satisfatório, razão pela qual os STATES estão extremamente endividados.

Para complicar a bancarrota norte-americana, as grandes empresas norte-americanas fugiram para Paraísos Fiscais. Assim, aquele país símbolo do capitalismo neoliberal, perdeu o controle de sua economia. Ficou sem ter o que exportar. Agora, quase tudo é importado. Pago com dinheiro sem lastro, tal como tem acontecido desde a criação do FMI - Fundo Monetário Internacional e principalmente depois da extinção do padrão-ouro para o dólar na década de 1970.

A VERDADE SOBRE O NEOLIBERALISMO ESCRAVOCRATA - FORMAÇÃO DE CARTÉIS

De acordo com o liberalismo clássico preconizado por Adam Smith, o bom funcionamento do mercado é fruto do adequado alinhamento das compensações privadas e dos benefícios sociais, de forma que as pessoas com maior nível de produtividade (uma maior contribuição social) receberiam mais.

Porém, como adverte Stiglitz, o próprio Adam Smith tinha a consciência de uma das circunstâncias em que os retornos privados e sociais se diferem. Como explicou o pai do liberalismo:

"É raro que duas pessoas do mesmo ramo de negócios se encontrarem, ainda que num âmbito recreativo, sem que daí resulte uma conspiração contra o público, ou um acordo de subida de preços".

É que os mercados, por si só, não costumam obter resultados eficientes e desejáveis para toda a sociedade, o que confere justificativa para que o Estado corrigia as suas falhas a partir de políticas públicas que alinhem os incentivos privados e sociais.

Assim, mesmo sob uma perspectiva liberal, o rent-seeking é nocivo, pois quando o Estado, ao revés de harmonizar os interesses do mercado com os da sociedade, agrava as contradições entre eles, estabelecendo políticas que privilegiam os primeiros em detrimento dos últimos, estará contribuindo para o mal funcionamento do próprio sistema econômico, com a criação daquilo que Karl Polanyi, na obra A Grande Transformação, designou por sociedade de mercado.

Nestas circunstâncias, o subsídio ao capital aumenta o seu retorno sem contribuir para o crescimento econômico, protegendo os seus detentores mesmo quando estes se mostram ineficientes, criando uma inércia política que contribui com as forças de divergência entre as classes sociais, comprometendo o financiamento de políticas públicas que poderiam levar ao desenvolvimento social e nacional.

PARA QUE O POVO NÃO SEJA ESCRAVIZADO, É PRECISO O CONTROLE ESTATAL

Como é imperioso reconhecer, o capital nem sempre é apenas um veículo para a ganância privada ineficiente para a sociedade. Como era fácil conceber no período pós-guerra, durante o predomínio das políticas keynesianas advindas do consenso de Bretton Woods, há muitas razões que unem o aumento do bem-estar social ao impulso ao retorno do capital privado.

Como sustenta para Shi-Ling Hsu:

Em primeiro lugar, o capital e o trabalho são quase sempre complementares em certa medida. Ativado o capital, geralmente cria empregos.

NOTA DO COSIFE:

Por isso, alguns dizem que Capital é Trabalho. Capital sem geração de emprego e produção é mera acumulação de dinheiro virtual, sinônimo de ganho especulativo (intangível).

Bem intangível é aquele não se pode pegar ou ver. O intangível só tem valor se alguém quiser dar algo por ele. A especulação é assim. Trata-se de dinheiro volátil, que pode sumir, evaporar, de um momento para outro. A fortuna surrealista de agora pode virar pó daqui a pouco.

Isto aconteceu com os antigos Fundos de Commodities no Brasil (Fundos de Hedge do Mercado Futuro das Bolsas de Valores) e com os Fundos de Hedge criados em Paraísos Fiscais (que em tese teriam a finalidade de proteger os investimentos de bruscas variações de preço ou cotação). Tais perdas mediante bruscas flutuações das cotações, geralmente acontece no Mercado de Opções quando ninguém mais quer dar qualquer valor por ela. Assim, a opção de compra ou de venda virou pó. Quem comprou perdeu e quem vendeu ganhou.

Os Fundos de Hedge provocaram a insolvência de Fundos de Pensão de quase a metade dos Estados norte-americanos depois da eclosão da Crise de 2008.

É o que pode ocorrer com os detentores de dólares norte-americanos, inclusive com o Brasil, China e Rússia (grandes detentores), se a moeda dos BRICS for lançada. Por isso há relativa hesitação dos BRICS.

Seria necessário inicialmente gastar esses dólares das reservas monetárias na compra de empresas norte-americanas. Mas, o governo norte-americano, ao contrário do Brasil, da China e da Rússia, não tem empresas para vender (privatizar) e também não tem reservas minerais para serem privatizadas.

Comparando-se os países com as empresas, aquele país símbolo do capitalismo sem capital é uma empresa com passivo a descoberto.

Mas, Temmer obviamente é contra essa associação entre os BRICS para combate a Nova Ordem Mundial dos que atuam no Shadow Banking System (Sistema Bancário Fantasma). Nosso presidente prefere que o Brasil passe para a condição de colônia de magnatas sonegadores de tributos estabelecidos em paraísos fiscais, cada um deles administrando seus respectivos Trustes, que são tidos como forma de Blindagem Fiscal e Patrimonial, que se resume na ocultação de bens, direitos e valores em Paraísos Fiscais.

Em segundo lugar, as incertezas políticas e regulatórias podem suprimir de forma ineficiente a formação do capital, sendo economicamente eficiente proteger o capital dos caprichos dos reguladores. Finalmente, a promoção governamental do capital pode desbloquear mercados críticos, que não receberiam o afluxo de recurso sem os estímulos, gerando o crescimento econômico.

Estas considerações políticas em favor da promoção do capital são válidas, mas devem também ser levadas em consideração as externalidades latentes. Esta promoção e proteção do sistema jurídico ao capital tem o duplo efeito propulsor das desigualdades de riqueza. Inicialmente as molduras jurídicas são concebidas de maneira a criar altos retornos de capital privado, sem contribuir necessariamente para o crescimento econômico. Uma vez que o capital é formado, ele cria um forte incentivo para resistir à qualquer reforma distributiva que possa ameaçar a sua acumulação pelos seus proprietários.

Por isso, é preciso ficar atento à advertência de Stiglitz quando diz que as políticas macroeconômicas têm sido limitadas pela ideologia fundamentalista dos mercados que serve os interesses dos que estão no topo, às custas do resto da sociedade, a partir das atividades de rent-seeking, que tanto contribuem para o aumento da desigualdade social.

A MISÉRIA CRIADA PELA AUSTERIDADE IMPOSTA PELO FMI

Na América Latina, houve um grande incremento da desigualdade com a aplicação das políticas de austeridade ditadas pelo FMI e pelo Banco Mundial nos anos de 1990. A partir de 2000, começou-se a reverter esse quadro.

No Brasil, em especial, a desigualdade tem recuado sensivelmente, atingindo os patamares verificados nos anos de 1960, antes do Golpe Militar de 1964.  Porém, como adverte François Borguignon, em The Globalization of Inequality, a desigualdade na América Latina [e na África] ainda se encontra entre a pior do mundo, excepcionando alguns países do sul da África.

Como aponta Anthony Atkinson, em Desigualdade - O que pode ser feito?, não se deve estabelecer uma correção direta entre a redução da desigualdade na América Latina, entre 2000 e 2010, e o crescimento econômico, uma vez que a primeira caiu em países que vivenciaram crescimento econômico rápido, como Chile, Panamá e Peru, e em países com períodos de baixo crescimento, como Brasil e México.

Também não há correlação automática entre a queda do índice Gini e a orientação política dos governos, uma vez que a desigualdade caiu sob o comando da centro-esquerda, como na Argentina, Bolívia, Brasil, Chile e Venezuela, bem como em países governados por partidos de centro-direita, como México e Peru.

NOTA DO COSIFE:

Sobre o Coeficiente Gini cabe uma observação.

Considerando-se os índices de desigualdade apresentados no endereçamento acima, existem países muito pobres (sem reservas naturais e sem desenvolvimento econômico) em que a desigualdade entre pobres e ricos é pequena.

Existem países ricos em reservas naturais, como os do cone sul-africano, em que a desigualdade é muito grande em razão da convivência durante séculos com a segregação racial (apartheid).

Em países latino-americanos a segregação social é mais comum que a segregação racial.

SÉCULO XXI: POLÍTICAS GOVERNAMENTAIS PARA REDUÇÃO DA DESIGUALDADE SOCIAL

Facundo Alvaredo e Leonardo Gasparini, em Recent Trendes in Inequality and Poverty in Devoloping Countries, noticiam que as políticas de redução da desigualdade implementadas no continente latino-americano neste início de século têm em comum é combinação de mudanças nas rendas de mercado e a redistribuição expandida, por meio da redução da distância de salários dos trabalhadores mais e menos educados, da transferência governamental progressiva, do aumento substancial do salário mínimo e da expansão da assistência social.

No Brasil em especial, de acordo com a pesquisa de Ricardo Barros, Mirella de Carvalho, Samuel Franco e Rosane Mendonça, intitulada Markets, the State, and the Dynamics of Inequality in Brazil, desde 2000, a desigualdade de renda no Brasil vem diminuindo de forma constante e acentuada. Como consequência, a renda per capita dos 10 % da base da população tem aumentado a taxas muito altas, de 7% ao ano, bem acima da média nacional.

Por sua vez, a pobreza extrema tem diminuído em três vezes o ritmo necessário para cumprir o primeiro Objetivo de Desenvolvimento do Milênio, e mais da metade do declínio veio de reduções na desigualdade de renda. Identificam os referidos autores como fatores responsáveis para o declínio recente da desigualdade o aumento das transferências governamentais contributivas e não contributivas; o declínio nas diferenças salariais por nível educacional e reduções na desigualdade na educação causada pela expansão acelerada do nível educacional da força de trabalho; e a melhoria na integração espacial e setorial dos mercados de trabalho, em particular entre as áreas metropolitanas e não-metropolitanas.

O ABSOLUTISMO FEUDAL DO GOVERNANTE GOLPISTA

Contudo, em nosso país, o absenteísmo estatal [o autoritarismo vindo do feudalismo ou o desprezo ao eleitor, à democracia e ao Estado de Direito] advindo da eventual aprovação da PEC 241, levará a uma rápida reversão do quadro, agravando o triste cenário de desigualdade que sempre assolou o nosso país, com a transferência de renda [popular] para o topo da pirâmide, a partir da lógica condenada por Zygmunt Bauman, na obra A Riqueza de poucos beneficia todos nós?:

Há um fabuloso crescimento econômico das fortunas da parcela de 1% dos mais ricos, para piorar o que já é péssimo, num período de austeridade sem paralelo para a maioria dos 99% remanescentes. (...) O quadro geral deixa pouco ou nenhum espaço a dúvida: como hoje se apresentam as coisas, o crescimento econômico não pressagia, para a maioria de nós, a chegada de um futuro melhor”.

Como se vê, a austeridade, tal como é preconizada aqui e alhures [principalmente imposta aos menos favorecidos europeus], ainda que sob a roupagem inodora da responsabilidade fiscal, tem ideologia e compromisso com a transferência de renda da base para o topo da pirâmide social. Assim, longe de ser uma alternativa como propõe o título desse artigo, a PEC 241 não só estabelece uma austeridade seletiva, como, e por isso, se destina às atividades de rent-seeking, promovendo a transferência de riqueza dos mais pobres para os mais ricos.

Por isso, é a PEC da desigualdade!

NOTA DO COSIFE:

Tudo isto significa que, aqueles empresários favoráveis à PEC 241, definitivamente não querem vender seus produtos para o Povo Brasileiro. Querem vender somente para o exterior.

Logo, nesse processo, o Povo Brasileiro servirá apenas como mão de obra, produzindo em regime de semiescravidão, com baixos salários e sem direitos trabalhistas e previdenciários.







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