Ano XXVI - 21 de novembro de 2024

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POÇOS SEM FUNDOS OU VOLTA KEYNES, ESTÁS PERDOADO



CONTABILIDADE CRIATIVA - CONTABILIDADE FRAUDULENTA

FRAUDES CONTÁBEIS E FINANCEIRAS DAS MULTINACIONAIS

FALSIFICAÇÃO MATERIAL E IDEOLÓGICA DA ESCRITURAÇÃO

POÇOS SEM FUNDOS OU VOLTA KEYNES, ESTÁS PERDOADO (Revisado em 21-02-2024)

Por António Gonçalves - Julho/2002 - texto escrito em português de Portugal, publicado pela Revista NON! (*1996 †2002) de Coimbra - Portugal

DESTAQUE: Atrever-me-ia a vaticinar que, de há uns tempos para cá, a primeira curiosidade a satisfazer pelo comum leitor de jornais consistirá em saber que nova grande empresa americana saltará para a primeira página devido à contabilidade criativa e fraudulenta dos seus gestores e auditores.

Sugeriria, até, que, dada a proximidade da “silly season[temporada ou estação boba ou verão de notícias frívolas], acertaria em cheio o jornal que promovesse um concurso [de insanas apostas, como acontecem nas bolsas de valores] através do qual os leitores tentassem acertar na empresa que, no dia ou, vá lá, na semana seguinte, faria o escândalo da primeira página. Tal concurso, para além fidelizar leitores, teria a vantagem de cultivar o interesse destes pelos méritos do neoliberalismo, da economia de mercado e do chamado capitalismo popular.

Tornou-se hábito dizer-se que, após o “11 de Setembro”, o mundo deixou de ser o mesmo. Na realidade as impressões digitais da mudança já existiam: desde quando, em finais da década de oitenta, com a queda do muro de Berlim o poder político, militar e econômico se concentrou num único império que, por préstimo da globalização neoliberal, não reconhece fronteiras, nem princípios tidos por universais.

As vantagens libertadoras que o desenvolvimento das novas tecnologias anunciava ao mundo, têm servido preferencialmente como formas de domínio dos povos. Se algo mudou com o “11 de Setembro” foi o salto qualitativo no conflito liberdade/solidariedade vs segurança a favor da última.

O que de novo nos trouxe o ataque às Torres Gêmeas - para além de nos revelar aspectos hediondos da natureza humana, até então ao abrigo da especulação mais ousada - foi o pretexto para mais uma acha [lenha] na fogueira que é contra-reforma do ataque aos valores que, no século XIX, a revolução francesa havia inscrito nos trilhos do século XX. L

Trata-se de contra-reforma que tem como ícone a segurança do condomínio privado à escala universal, da “justiça infinita” e da “liberdade duradoura” erigida a superlativo e construtora de novos e literais muros; segurança que despoja a democracia dos seus objetivos e do seu contexto harmonioso e que lhe perverte o conceito num pérfido eufemismo destituído de qualquer imaginário simbólico.

A ser, como julgo ser, verdade o ditado que afirma que, o que é mau para a Ford, afeta o mundo inteiro, avisado será, para perceber a realidade atual, tomar a hegemonizada globalização como referência. Não porque varinha mágica para a solução dos problemas que afetam a humanidade, mas para que nos demos conta de como as decisões, por ação ou omissão, tomadas na sede do império, se regem bem mais por interesses particulares que globais, sem, porém, deixarem de ter consequências para todo o planeta.

Sabíamos já que o mais comum dos mortais não estava imune às consequências dos devaneios sexuais do Sr. Clinton ou dos tiques de pistoleiro texano do Sr. Bush. Disso já quase ninguém tinha grandes dúvidas. Mas, darmo-nos conta que a nossa segurança social pode estar nas mãos dos ficcionistas dos “trade centers” mundiais, é, até certo ponto, novidade e deve provocar-nos novas, perturbadoras e inquietantes preocupações...

Tão ou mais emblemático que o “11 de Setembro”, o que marca os tempos que fluem, e que já vem de antes, é a forma como o jogo financeiro condiciona a segurança dos cidadãos, a naturalidade e a frequência com que tomamos conhecimento de que mais uma grande empresa americana - o que, muitas vezes, equivale a sinônimo de mundial - tinha uma CONTABILIDADE CRIATIVA e os seus gestores mais não eram que um bando de especialistas fraudulentos que ludibriaram a maioria dos investidores - cada vez mais, por força do dito capitalismo popular, cidadãos comuns.

Quando se pensava que uma Enron era um caso isolado, tal como as cerejas, atrás desta vieram Anderson, Global Crossing, Dinegy, Duke Energy, Imclone Systems, Enterasys, Tyco, Computer Asociates, Network Asociates, Qwest, Adelphia, Kmart, Peregrine Systems, Rite Aid, Lucent, Xerox... e o que a seguir se verá.

As poupanças populares arriscam-se a ser volatilizadas pelos contabilistas criativos, pelas fraudes financeiras.

O cidadão comum, súdito de Estados que alienam [privatizam] as suas obrigações de solidariedade e segurança social, induzido a acautelar o seu futuro colocando as suas poupanças no mercado de capitais, começa a dar-se conta como, através da fraude, gestores, contabilistas e auditores sem escrúpulos, ao mesmo tempo que escondem o verdadeiro nível de endividamento das empresas, encenam para estas resultados influenciando e inflacionando-lhes os valores de mercado.

Mas, como esta ficção não pode manter-se indefinidamente, tais empresas acabam por ver refletida a sua própria realidade e transformar em papéis inúteis aquilo que, para muita gente, era tido como último e único recurso para uma reforma merecidamente tranquila e segura.

Não surpreendem, já, as anunciadas suspeitas de promiscuidade entre os agentes das fraudes e os financiamentos de campanhas eleitorais, tal como não se estranha que, como em todos os processos de criminosos com direitos de autoria em colarinhos engomados, exista sempre um número reduzido de peritos da fraude, autênticos autores de crimes contra a humanidade, que saem a ganhar e que se escapam pelos buracos das malhas desta, socialmente débil, justiça.

Resta-nos a esperança de que estes sinais não confirmem os anúncios do fim da história, mas que sejam o prenúncio, já não digo do fim do capitalismo, mas da tomada de consciência de que, a manter-se o sistema, que se não fomenta pelo menos convive com esta surrealista realidade, caminhamos para o abismo.

E não haverá Keynes, nem Tobin que nos valham.







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