A REFORMA TRIBUTÁRIA IGUALITÁRIA NO BRASIL
THOMAS PIKETTY: O CAPITAL NO SÉCULO XXI
São Paulo, 20/03/2015
Referências: Desigualdade. Tributação Justa. Progressividade. Imposto de Renda. Imposto sobre Grandes Fortunas. Transparência Internacional.
PIKETTY E A REFORMA TRIBUTÁRIA IGUALITÁRIA NO BRASIL
Por Ricardo Lodi Ribeiro - Professor Adjunto de Direito Financeiro da UERJ. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito da UERJ. Ex-Procurador da Fazenda Nacional. Presidente da Sociedade Brasileira de Direito Tributário (SBDT). Advogado e Parecerista. Publicado pela Revista de Finanças Públicas - Tributação e Desenvolvimento - V.3, N.3 (2015). Acesso em 20/03/2015.
1. INTRODUÇÃO
A publicação, em 2014, da obra “O Capital no Século XXI”, do economista francês Thomas Piketty (1) , representou não só um enorme fenômeno editorial, como um grande acontecimento nos debates econômicos, filosóficos e políticos, no que tange ao estudo do tema da desigualdade entre ricos e pobres ao longo dos últimos séculos nos países capitalistas.
(1) PIKETTY, Thomas. O Capital no Século XXI. Trad. Mônica Baumgarten de Bolle. Rio de Janeiro: Intríseca, 2014.
Ao contrário do que o título pode sugerir, não se trata de uma obra que procure adaptar as ideias de Karl Marx ao século XXI.
Apesar de reconhecer o acerto, em parte, do diagnóstico marxista quanto à acumulação de capital inerente ao sistema de produção capitalista, Piketty demonstra que Marx foi refém, no século XIX, da inexistência de bases de pesquisa de dados históricos sobre a evolução do patrimônio e da renda, bem como da desconsideração da variável referente ao avanço tecnológico como mecanismo capaz de viabilizar o infinito crescimento do capital privado.
E esse alicerce em fartos dados históricos é o grande trunfo da obra de Piketty. Concorde-se ou não com as soluções por ele propostas, é indiscutível a solidez das bases de informações que ele utiliza em suas análises, a partir de um esforço, sem precedentes comparáveis até hoje, de compilar a evolução de renda e do capital nos últimos duzentos anos, em 20 países (2) , em especial nos EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Suécia, Itália, Canadá, Austrália e Japão.
(2) O Brasil não foi estudado na obra, segundo o autor, em razão da ausência de acesso aos dados fiscais pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, o que começa a ser revertido mais recentemente.
Apesar da conclusão de que a concentração de renda e de capital é inerente ao modo de produção capitalista, e de que a partir dos anos de 1980 a desigualdade social tem aumentado a níveis comparáveis ao final do século XIX, Piketty não propõe a superação do capitalismo.
Ao contrário, defende a adoção de medidas baseadas no liberalismo a partir do compromisso ideal entre justiça social e liberdade individual (3), necessário para a salvação da liberdade em um mundo globalizado, já que, na sua concepção, a democracia estaria condenada pelo aumento vertiginoso da desigualdade. (4)
(3) PIKETTY. O Capital no Século XXI, p. 492.
(4) Sobre a incompatibilidade da democracia com os altos graus de desigualdade e exclusão social, vide: FORRESTER, Viviane: O Horror Econômico. Trad. Álvaro Lorencini. São Paulo: UNESP, 1997 e BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo – Ulrich Beck conversa com Johanes Willms. Trad. Luiz Antônio Oliveira de Araújo. São Paulo: UNESP, 2000.
Nesse combate às desigualdades comprometedoras do desenvolvimento do capitalismo e do livre mercado, propõe Piketty como principais medidas o aumento da tributação dos mais ricos, com o incremento da progressividade do imposto de renda e do imposto sobre heranças, a introdução de um imposto mundial sobre o capital e o combate à concorrência tributária entre países por meio da transparência fiscal internacional.
Como tais propostas causam grande impacto na base tributária dos Estados nacionais, é importante identificar de que forma se coadunam com o sistema tributário de cada país. O presente estudo tem como objetivo a análise dessas ideias à luz do sistema tributário brasileiro.
CONTINUA...